Juiz federal irá ao Senado amanhã para discutir projeto de lei que prevê punição a abuso de autoridade por juízes, procuradores e outras classes
Na madrugada desta quarta-feira, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou proposta que pune juízes e magistrados por abusos, mas o texto, vago, estabelece que essas autoridades podem sofrer sanções no caso de “expressar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento” ou promover a “instauração de procedimento sem que existam indícios mínimos de prática de algum delito”. Pelo texto aprovado na Câmara, será responsabilizado “quem ajuíza ação civil pública e de improbidade temerárias, com má-fé, manifesta intenção de promoção pessoa ou visando perseguição política”. Como é controversa a aferição se um magistrado ou procurador, por exemplo, agiu com má-fé ou temeridade, Moro vai sugerir ao Senado que seja incorporado à lei trecho que estabelece que “não configura crime previsto nesta lei a divergência na interpretação da lei penal ou processual penal ou na avaliação de fatos e provas”.
Moro argumenta que “direito não é matemática e pessoas razoáveis podem divergir razoavelmente na interpretação da lei e na avaliação de fatos e provas”. Segundo o juiz federal, “sem salvaguardas, a lei terá o efeito prático de restringir a atuação vinculada à lei e submeter Juizes, Desembargadores, Ministros, Promotores e Policiais a acusações ou a ameaças temerárias por parte de criminosos, quer membros de organizações criminosas, traficantes, terroristas e mesmo envolvidos em esquemas de corrupção e lavagem de dinheiro”.
O principal risco do projeto de lei de autoria do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), de acordo com o Sergio Moro, é a potencialização do “crime de hermenêutica”, ou seja, “a criminalização da interpretação ou aplicação independente da lei”.
“Caso acolhida esta singela sugestão, restará afastada parte dos principais receios de que a nova lei de abuso de autoridade tenha o efeito prático de tolher a independência da magistratura e a atuação vinculada à lei por parte do Ministério Público e da autoridade policial, o que prejudicaria não só a assim denominada Operação Lava-Jato, mas também todas as outras investigações e persecuções criminais e a própria aplicação imparcial e independente da lei penal”, diz o juiz federal no ofício.
A estratégia de Sergio Moro acaba por colocar os senadores nas cordas, uma vez que o Congresso já está sendo acusado de tentar tolher a independência dos promotores, procuradores e juízes. O Ministério Público, por exemplo, se insurgiu contra a votação ocorrida na madrugada desta quarta na Câmara. Com a emenda-Moro, o Senado ou acolhe a sugestão e deixa clara a ressalva de que interpretações divergentes de diferentes instâncias judiciais não podem ser enquadradas como abuso de autoridade ou corrobora a decisão dos deputados e endossa o que o MP classifica como mordaça às investigações.
No ofício a ser encaminhado aos senadores, o juiz da Lava-Jato também destaca que “este não é o melhor momento para deliberação sobre o referido projeto, uma vez que eventual aprovação poderia ser interpretada como tratando-se de medida destinada a prevenir o avanço de investigações criminais importantes, entre elas a assim denominada Operação Lava-Jato”. Ainda assim, afirmou que “é imprescindível evitar que seja criminalizada, na prática, a interpretação da lei e a avaliação dos fatos e provas pela autoridade judicial, pela autoridade do Ministério Público e pela autoridade policial”.
“Não é o melhor momento”